Tiktok, TDAH e Indústria Cultural

Caio Vinicius
5 min readOct 23, 2023

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Filmes de três horas são longos demais ou você está sendo manipulado?

Leonardo DiCaprio e Lily Gladstone em “Killers of the Flower Moon”

Eu tenho TDAH. Enquanto estou escrevendo esse texto, provavelmente peguei no meu celular talvez duas vezes. Porém, não sou um usuário que consome de forma árdua conteúdos rápidos no Instagram, Youtube ou Tiktok, por exemplo. Gosto de conteúdos maiores, como palestras ou vídeos ensaio que demandam mais tempo e atenção, mesmo que as vezes seja díficil focar. Não acho que o meu costume de consumir conteúdos maiores nas mídias sociais seja algo que várias pessoas fazem (principalmente as pessoas que tem tdah igual eu), mas optei por fazer isso para não piorar o meu problema de desatenção, que com certeza, piorou durante a pandemia e acho que a nossa desatenção coletiva com certeza tem algo haver com o conteúdo que consumimos quando estavamos isolados. Passei muito tempo sozinho durante a pandemia, e lembro que foi uma das épocas que mais consumia conteúdo, por simplesmente ser extremamente mais novo, não estar tendo aulas de forma convencional e também, não trabalhava. Então, passava o dia assistindo e consumindo coisas. Não consumia só conteúdos rápidos, porém, eles também estavam na minha mira. Acho que meu consumo midiatico mudou bastante depois da pandemia, e também meu tdah ficou ainda pior. Recentemente, o Scorsese lançou o filme novo dele, “Killers of the Flower Moon”, e vi várias pessoas reclamando da duração do filme. Inúmeras. Oque eu acho mais bizarro, é que as mesmas pessoas que reclamam da duração do filme, passam horas do seu dia maratonando séries. Não digo que isso não tem um motivo claro; Séries geralmente tem de 30 a 60 minutos de duração por episódio, entre 6, 8 ou 10 episódios por temporadas. Logo, a agilidade e a rapidez do conteúdo consumido, é muito mais chamativo do que um filme de três, quatro horas de duração, que não vai estimular seu cérebro com dopamina a cada 20 segundos, como o tiktok faz, por exemplo. Digo isso por experiência própria. Ontem a noite estava assitindo um filme, e parei para pegar o celular algumas vezes. Um filme que as vezes tem duas horas, na minha forma de consumo acaba tendo meia hora a mais, porque acabo me perdendo no Twitter de forma inconsciente. Claro que meu diagnóstico ajuda, e com certeza as redes sociais também. Não que terminar um livro ou um filme longo seja uma tarefa moral. Não digo que tudo tem que ser terminado de forma sistemática, porque a gente tem que levar o contexto do consumidor na hora de experienciar a obra. Isso é fato. Porém, para pessoas que querem terminar um filme e não conseguem porque simplesmente chegou uma notificação do Tiktok, e acabam se perdendo no algoritmo, isso tem que ser pensado de forma sistemática, porque isso pode (e vai!) prejudicar a formação de várias crianças conforme os anos vão passando. Não digo que é uma tarefa fácil, pois no capitalismo tardio nosso conteúdo é manipulado não por demanda do público, mas por um constante acúmulo de capital que as grandes empresas fazem, não dando a mínima para a cultural ou para oque os espectadores querem assistir. É só olhar para os cinemas de shopping, principalmente no interior de São Paulo, onde eu moro, que não vai ter nenhuma sala passando o filme novo do Scorsese, e que estão reproduzindo Trolls 3 e o filme novo da Patrulha Canina. Esses filmes estão ali porque os pais levam os filhos para assistir, é popular, de fácil consumo, etc. Mesmo não tendo uma clara demanda do público por esses filmes. Filmes de super herói não são de gosto popular e ponto. O gosto é construído, manipulado e reproduzido pela indústria cultural. Não é atoa que todo filme da Marvel, com as cenas pós-créditos, o próximo filme é mostrado e incentivado, como se o próximo importasse e não oque você está assistindo agora. Essa lógica lembra algum aplicativo de vídeos curtos que você consome? Pois é. É o cinema adotando uma linguagem Tiktok para suas produções. Oque é extremamente preocupante e nada legal para o fomento cultural.

Martin Scorsese

Não estou falando para você desinstalar o Tiktok do seu celular ou para parar de consumir conteúdos rápidos. Não é para ser um texto moralista e etc; É mais para falar da minha própria experiência sendo um jovem adulto com TDAH, que trabalha e estuda, e que gosta de consumir filmes e livros, mas que para fazer isso, preciso me colocar longe das telas porque as vezes isso é extremamente prejudicial para minha experiência individual. Eu posto vídeos no Tiktok e no reels do Instagram; afinal, se eu quero ser produtor de conteúdo, não posso me limitar a esses textos que faço aqui como a única forma de comunicação. Se o consumo é rápido, superficial e constante, preciso me adequar de alguma forma a isso se quiser chegar em pessoas e etc. Nem todo mundo lê isso aqui. Provavelmente não vou chegar em muitas pessoas com esse texto. Mas não vou deixar de escrever, da mesma forma que não vou deixar de produzir para outras plataformas. Oque eu digo é o seguinte: se quisermos ter um consumo de mídia um pouco mais consciente, precisamos olhar para essas redes sociais e ver os problemas materiais que elas causam na aprendizagem, e ver se conseguimos tirar proveito dessas redes, porque em todo o lugar vai ter pessoas fazendo um conteúdo que vai valer a pena ser consumido. Com certeza. Seja no Tiktok, Youtube, Instagram, etc. Oque não acho interessante é deixar nosso gosto ser moldado por uma indústria que não está nem ai com o consumo de mídia, e que vai criar filmes, músicas, livros, jogos, de forma homogênea e incentivando estímulos e produções de dopaminas desenfreadas. Não acho que o filme do Scorsese seja grande demais. Acho que nossa desatenção é demais. E que se a gente tem tempo e foco para maratonar séries durante 10 horas, acho que tirar umas quatro horas para contemplar um dos maiores cineastas vivos é algo que sim, a gente consegue fazer. Tiktok é o futuro, e o futuro pode ser amedrontador se a gente não se colocar a parte de tudo oque está por vir. O lucro desenfreado não pode ser o objetivo, e sim nossa emancipação e bem estar. Acho que é isso. Me segue nas redes ali embaixo (inclusive no Tiktok kkkkkkk).

Instagram, Tiktok, Youtube e Spotify

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